* Bram Stoker e os alhos combatentes





Grande parte das lendas e superstições sobre vampiros originaram-se no leste europeu. Não há dúvidas, entretanto, de que a imagem definitiva e arquetípica do vampiro aristocrático, de aparência inteligente, fala macia e roupas elegantes venha do irlandês Bram Stoker. Até então, os vampiros das tradições do leste, com raras exceções, eram retratados como monstros grotescos, criaturas de egos mal recortados e psiquês descalibradas, maltrapilhos de unhas pútridas, cabelos desorganizados e peles arroxeadas e escamantes. Bram, para criar o nosso vampiro definitivo, valeu-se de várias características do conjunto de aberrações folclóricas, temperando-as em sua criação. Ao topo delas, porém, pincelou seu morcego humano com vernizes de nobreza e modernidade. 

Drácula é um romance que, apesar de sua veia popular e de fácil assimilação, instiga assuntos complexos como cultura de massas, insanidade mental, subtextualidade freudiana e junguiana, gênero, sexualidade feminina, colonização reversiva e modernidade. (Para alguns catedráticos, o romance pende entre a alegoria católica e a ansiedade psico-sexual vitoriana). A narrativa esconde alguns segredos nas profundezas de sua trama gótica. A exemplo de outras obras de arte e literatura, o livro revela parte de um tenso contexto social e político da época em que fora escrito, em 1897. 

A chegada, na Londres Vitoriana, de um estrangeiro misterioso, retratado na forma de um vampiro apreciador de sangue humano e com intenções pouco amistosas como a de dominar a Inglaterra, representava simbolicamente - quem diria?- as ansiedades e delírios de um império em declínio, repleto de cidadãos temerosos com hipotéticas invasões de alguma força estrangeira, possivelmente a da marinha francesa. Trocando em miúdos, o longo período de vampirismo colonialista imposto pelos britânicos assombrava-os de volta em seus devaneios oníricos e imaginações literárias. A história, porém, acabou por provar, ao final, que suas paranóias não estavam completamente desprovidas de fundamento. O que erraram, mesmo, - e feio - fora o alvo de suas previsões. Quem veio com tudo para cima deles não foi a França e, sim, a Alemanha. Se tivessem, pelo menos, recorrido ao charmoso conde da Transilvânia - e aos seus experientes vizinhos romenos -, saberiam que, para repelir o monstro invasor, bastariam apenas algumas poucas réstias de alho ... Quem sabe a história da primeira guerra poderia, desta forma, ter tido outro desfecho?

(fotos:llunkes)

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Em algumas áreas rurais do leste europeu, ainda no presente, os moradores esfregam dentes de alho em seus animais domésticos e fixam réstias do vegetal repelente em suas portas frontais com o intuito de expulsar os vampiros que vagam à noite pelos seus povoados. Outra estratégia  - infalível - nos reporta ao divertido Vila Sésamo (quem se lembra da canção do Conde?). Vampiros são tidos como contadores compulsivos. Ao espalhar sementes de papoula e mostarda pelos cemitérios, os supersticiosos acreditam que esses hematófagos notívagos, ao saírem de suas tumbas, são compelidos a contá-las, uma a uma, e assim o fazem até o raiar do sol, quando, forçados pela claridade, retornam a seus caixões-aposentos sem a companhia de alguma vítima fatal.  That is clever!!!! Fasterrrrr, fasterrrr, it is so exciting, one, two, three, four, one, two, three, four, ai,ai,ai,ai ...


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receita anti-vampiros (just in case!) :
pannacotta  de confit de alho e parmesão com figos marinados no balsâmico de figos





A harmonização perfeita entre a cremosidade perfumada do confit de alho, a agudez 'noseada' do parmesão, a acidez adocicada dos figos e a crocância da torradinha morna deixa essa receita irresistível.


(para 4 pessoas)



para o confit de alho 

 de 5 cabeças grandes de alho, descascados 
óleo vegetal, o quanto baste para cobrir o alho
raminho de tomilho fresco ou alecrim (opcional) 
folha pequena de louro 
1/2 xícara de creme de leite fresco 
1/2 xícara de leite integral 
casca de parmesão ou 50 g de parmesão em bloco inteiro (não ralar) 
2 colheres de chá (rasas) de gelatina em pó sem sabor dissovidas em 2 colheres de sopa de água fria 
pitada de noz moscada ralada fresca 
pitada de pimenta caiena ou branca 
sal marinho 

para o figo 

4 figos maduros, descascados e cortados em cubos pequenos 
1 colher de sopa de balsâmico em infusão de figos, ou aceto balsâmico tradicional + pitada de açúcar 
micro folhas de rúcula 

preparo 

para a pannacotta 

1. Faça o confit de alho: Coloque o alho, o ramo de erva e o louro em uma panela pequena. Coloque o óleo até cobrir. Leve ao fogo bem baixo e deixe cozinhar até ficar macio (40 minutos, aproximadamente). Deixe esfriar. Escorra. Descarte a erva. Passe os dentes de alho pela peneira de forma a obter um purê homogêneo. Reserve. Guarde o óleo para outro uso, se desejar. Se for reutilizar o óleo, sugiro que utilize óleo de oliva. 

 2. Faça a pannacotta: Misture o leite e o creme. Coloque a casca ou o bloco de parmesão e leve ao fogo. Deixe ferver. Desligue. Deixe esfriar. Coe. Descarte o parmesção. Leve o leite-creme novamente ao fogo e deixe esquentar. Coloque a gelatina e dissolva por completo. Desligue. 

3. Inclua o purê de alho e misture bem. Acrescente o sal, a noz moscada e a pimenta. 

4. Distribua a mistura em quatro formas e leve à geladeira até firmar. 

finalizando 

Misture o figo e o balsâmico. Desenforme as pannacottas em quatro pratos. Disponha o figo marinado sobre as panacottas e decore com a rúcula. Sirva com torradinhas bem finas. Bom apetite.


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6 comentários:

Zila Bernd disse...

Vou experimentar pois adoro alho!! e muito mais ainda confit de alho...
Parabéns pelo belo blog!

Isabela disse...

Muito interessante a análise que você fez de "Drácula". Mais ainda foi a receita que você postou. Mas me ficou uma dúvida: eu, por exemplo, não sou muito fã de figos. Alguma possibilidade de substituição, sem quebrar a harmonia do prato? Desde já agradeço! E parabéns :)

Luciano Lunkes disse...

Isabela,
obrigado pelas colocações. Não tem problema se você deixar de lado os figos. Coma a pannacotta somente com as torradinhas como você faria com um patê. Sirva tambem como entrado com uma saladinha de folhas verdes. Ficará bacana também. Obrigado pela visita ao pato. Volte sempre. abraço

Luciano Lunkes disse...

Zilá, se fizeres a pannacotta me conte como ficou. Vou adorar saber as tuas impressões.

obrigado pela visita ao pato grande abraço

Julio Nitzke disse...

Oi, Luciano
Fiz a panacota no almoço para minhas irmãs, no domingo, e foi um sucesso.
Eu apenas tive que trocar os figos por morangos, pois não tinha figos no supermercado e acho que a combinação ficou ótima, também, pois o ácido dos morangos combinou com o adocicado do alho. Obrigado pela receita, e pela "aula virtual".abs.
Julio

Luciano Lunkes disse...

O prazer foi todo meu, Júlio. grande abraço